O QUE FAZER COM A RAIVA QUE SINTO DO RACISMO E A MISOGINIA DE TODOS OS
DIAS NO
MEU AMBIENTE DE TRABALHO
Por: Jacqueline Costa
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Fonte: Arquivo Pessoal |
“Preto
sujo!” Ou simplesmente: “Olhe, um preto! ”Cheguei ao mundo pretendendo
descobrir um sentido nas coisas, minha alma cheia do desejo de estar na origem
do mundo, e eis que me descubro objeto em meio a outros objetos. Enclausurado
nesta objetividade esmagadora, implorei ao outro. Seu olhar libertador,
percorrendo meu corpo subitamente livre de asperezas, me devolveu uma leveza que
eu pensava perdida e, extraindo-me do mundo, me entregou ao mundo. Mas, no novo
mundo, logo me choquei com a outra vertente, e o outro, através de gestos,
atitudes, olhares, fixou-me como se fixa uma solução com um estabilizador.
Fiquei furioso, exigi explicações... Não adiantou nada. Explodi. Aqui estão os
farelos reunidos por um outro eu. (FRANTZ FANON, 2008, p. 103).
Tenho percebido cada
vez mais que ter nascido mulher, preta e do interior, tem me colocado em
posições de muitos desafios ruins ao mesmo tempo tem me colocado em lugares de
destaque e de ascenção social muito bacana.
Desde o dia que eu
nasci venho lutando contra o racismo. Na infância eu tinha a minha família que
me acolhia e me confortava. Porque ir pra escola era o que eu mais amava fazer,
embora tivesse dificuldade no conteúdo, queria estar na escola, queria dançar,
declamar, fazer teatro, ler poesia... Chegar em casa, almoçar, brincar, brincar
até anoitecer.
Tenho sentido
fortemente que ao longo da minha trajetória esse fenômeno monstruoso, o
racismo, só tem aumentado, Depois dos 40 anos, ele ganhou uma parceira que não
gosta muito de nós mulheres, a senhora misógina.
Trabalho em uma universidade
que poderia ser o sonho de consumo de toda intelectual preta, sqn. Os processos
racistas, transfóbico, misógino, e muitos outros são muito fortemente vividos
aqui. Na sala de aula, nos corredores, no meu colegiado de curso.
Enquanto gestora, vivi
isso a todo instante, os canais que os (as) racistas usavam eram, e-mails,
processos que chegavam via ouvidoria, mímicas pra eu dizer os que eles queriam
que eu dissesse e muitos insultos presenciais.
O adoecimento chegou,
dores no corpo, mal humor, o isolamento das pessoas que eu amava e até chegar o
pensamento de tirar a minha vida. Sim, chegou fortemente, porque viver uma
sociedade racista, onde uma mulher preta não é respeitada, uma sociedade que
enfatiza somente o erro e nunca na aposta de que você pode ser mais, potente,
ter sucesso e ser feliz, é um processo adoecedor.
E hoje eu fiquei
pensando com o Audre Lord, feminista preta estadunidense, o que fazer com a
minha raiva que eu sinto dos (as) racistas? O que fazer? Se mesmo sendo
propositava, fazer ações antirracistas, participar de GTS, lutar contra o
racismo e todas as formas de opressão parece não adiantar. Se os espaços
institucionalizados, negam a sua existência, negam a sua intelectualidade,
negam a sua voz.
Mas se vocês racistas,
misóginos e machos acham que vou desistir se enganaram. Não vou desistir jamais
de lutar contra todas as formas de opressão, contra toda forma de tentativa de
silenciamento.
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Fonte: Arquivo Pessoal |
Se o meu corpo é negado
no estado do Ceará, onde a narrativa de não existir negro (a) é um discurso
oficial, pois vocês estão muito enganados (as) vão ter que aprender que existe
doutora preta sim, migrante, vinda do estado do Mato Grosso, que a mais de 10
anos está fora do seu estado da sua família pra estudar, pra realizar o sonho
de ser uma professora universitária. Nem que eu tenha que ir embora daqui, mas
vocês não arrancarão o meu sonho.
A pergunta que não quer
calar, pensando aqui o que fazer com essa raiva. Pois é, com todo o respeito as
minhas mais velhas feministas, pois ainda tenho que pensar no que fazer com
minha raiva em uma sociedade onde impera o poder dos Machos?
Pois é, por isso que
hoje eu saí correndo de uma reunião do meu colegiado de curso, porque senti a
perda da minha humanidade. Antes de correr eu falei o que sentia, precisa
explodir, precisava falar se não morreria.
Escute Branquitude,
macho e hétero, vocês nunca mais vão me silenciar, porque eu vou GRITAR E
DENUNCIAR, PRA TODO MUNDO OUVIR.
Pois, Toda vez que eu
sentir raiva dos (as) racistas e misóginos eu vou gritar, isso mesmo gritar,
gritar e gritar porque:
A MINHA VIDA NEGRA
IMPORTA!
A MINHA EXISTÊNCIA
IMPORTA!
A VIDA DE MUITAS DE NÓS
PRETAS IMPORTA!
A VIDA DO MEU POVO
IMPORTA!
AXÉ!
Sobre a autora: Sou
Jacqueline Costa, Mulher, Feminista preta, Mato-Grossense, 45 anos, Escritora, Docente
da Unilab/Ceará, Curso de Pedagogia.
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